Entrevista do Ministro dos Transportes e Comunicações de Moçambique, Paulo Zucula, ao jornal Notícias, de Moçambique

Os crescentes desafios e expectativas de desenvolvimento que se colocam ao país exigem que o Governo invista
rapidamente nos seus sistemas ferro-portuários e num curto espaço de tempo, concretamente, a partir dos próximos três ou quatro anos, mais de 15 biliões de dólares norte-americanos. Numa 1ª fase, o Ministério dos Transportes e Comunicações já aplica anualmente um bilião nos portos, aeroportos e nos sistemas ferroviários.

A construção, transferência, ampliação e modernização dos aeroportos constam ainda no rol das prioridades, numa altura, por exemplo, em que o Aeroporto de Tete passará a ter um âmbito regional, enquanto a antiga frota das aeronaves das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) encontra-se completamente renovada e espera receber novas encomendas de aeronaves modernas.
No transporte de cabotagem, já se mexeu alguma "palha" com a navegação experimental sobre o Lago Niassa, numa altura em que o Executivo está em avançadas negociações com o sector privado estrangeiro para explorar e incrementar esta atividade no país.
A crise no transporte público urbano, logística do carvão mineral no Baixo Zambeze e o projetado gás do Rovuma
constam ainda no rol das prioridades do Governo para o progresso de Moçambique, conforme revelou há dias em
entrevistas exclusivo à Reportagem da nossa Delegação da Beira o titular da pasta dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula.

Notícias (N) - Senhor Ministro dos Transportes e Comunicações, o país está em franco desenvolvimento e quais
são os grandes projectores do sector que dirige, particularmente no sistema ferro-portuário?
Paulo Zucula (PZ) - Bom, os projectos são muitos, como projectos, e talvez podemos dividi-los em dois grupos. O
primeiro, são os grandes projectos que estão em implementação ou quase em implementação ou que temos mais ou menos a certeza de que vão estar encaminhados para serem implementados. E temos outro grupo que chamamos projetos em carteira. São projectos que nós temos concebidos e desenhados, mas ainda estão um pouco longe de serem implementados ou pelo menos não temos todos os elementos para dizer que vão ser implementados. E quase todos eles são ferro-portuários e guiados para a exploração mineira, embora para o país sejam projectos que sirvam outros projectos e não só os projectos mineiros. Projectos mineiros são projectos âncoras que viabilizam estes projetos ferro-portuários. Alguns deles estão a ser implementados e vão entrar na 2ª fase.
N - Quais são e onde estão estes projectos?
PZ - Temos, por exemplo, no sul a linha de Ressano Garcia, linha do Limpopo e o Porto do Maputo em que a chamada 1ª fase foi já concluída há três anos, funcionando agora em pleno. Mas há um programa de expansão, porque há muito mais procura de carga para linha do Limpopo, Ressano Garcia e Porto do Maputo. O Porto do Maputo tem um compromisso de investir agora 600 milhões de dólares, basicamente na dragagem, acessos, cais e desenvolvimento de terminais, sobretudo de contentores e de carvão. Estes são alguns projectos que já estão em andamento e com resultados positivos. Por exemplo, o Porto do Maputo já atingiu o volume máximo do tempo colonial, em 15 milhões de toneladas no ano passado. Assim, estão a passar-se no Porto do Maputo coisas que nenhuma vez no tempo colonial se passou como a entrada de navios chamados panamax de cerca de 60 mil toneladas de arqueação bruta. No Porto do Maputo está a expandir-se o terminal de carvão e há um terminal de carros. Há 6/7 anos Moçambique importava viaturas por via Durban. Hoje, praticamente se inverteu isto. Já há carros que vêm para Maputo em trânsito para África do Sul.
As linhas de Ressano Garcia têm de ser aumentadas, porque o Porto do Maputo está a aumentar. Temos que ir para a 2ª fase e vamos tentar que seja possível esta via passar para 40 milhões de toneladas por ano. A linha de Limpopo também tem um projecto concebido para aumentar sua capacidade. Só que como está a beneficiar essencialmente Zimbabwe e o Zimbabwe está de novo a reactivar a economia, então, a linha fica um pouco limitada por isso. Mas é uma via que estamos a sonhar que vai voltar a fazer trabalho para o Zimbabwe e, eventualmente, poderá vir a ligar o Porto do Maputo com um potencial porto do extremo sul do Maputo com Botswana para escoar o carvão daquele país.
N - Em relação à reconquista da região, o que é hoje o Porto do Maputo?
PZ - O Porto do Maputo, por várias razões estruturais, deixou de ser usado por alguns países da região e chegou a descer até 2/3 milhões de toneladas por ano e, em 2012, chegamos aos 15 milhões de toneladas.
Todos os anos, o Porto do Maputo cresce na sua capacidade com novos investimentos e, em breve, nós vamos atingir facilmente 40 milhões de toneladas por ano. Se calhar não parar por aí.
N - Que projectos existem no centro do país?
PZ - Aqui encontrámos a linha de Sena que existe há bastante tempo (1914) que foi destruída e está a ser reabilitada.
Há cinco anos quando se visitava esta linha só se viam escombros, troncos e árvores que cresciam no meio da via. Hoje, a linha de Sena acordou mas continuamos a fazer a sua reabilitação para tentar chegar aos 20 milhões de toneladas por ano contra as actuais quatro e 6.5 milhões em breve. Ainda na região centro temos em carteira um projecto sobre o qual já lançamos um concurso público para que a sua construção inicie o mais tardar no próximo ano que é a linha de Macuse que há-de vir da zona de Tete, vai passar por Nhamaiabwe até ao Porto de Macuse, na Zambézia. Também temos, no centro de Moçambique, a chamada linha de Mutuale, que segue mais ou menos, numa 1ª fase, o mesmo projeto de Macuse, só que a partir de Nhamaiabwe, vai ligar Nacala na zona de Mutuale. É um projecto também cujo estudo já está concluído e estamos a discutir financiamentos com alguns parceiros. E, se tudo correr bem, pode ser também que no próximo ano inicie a sua construção. Temos depois o Porto da Beira que, como se sabe, começamos a sua expansão pelo terminal de carvão de cerca de seis milhões de toneladas por ano que já está a funcionar em pleno e tem quase esgotada a sua capacidade. Fizemos a dragagem no canal de Macúti e já temos alguns navios de grande calibre a entrarem no Porto da Beira. Estamos a negociar agora para construir o 2º terminal de granel que vai incluir carvão e ferro na ordem de 20 milhões de toneladas manuseadas por ano.
N - E na zona norte?
PZ - Temos o Porto de Nacala sobejamente conhecido, concretamente com a construção de um terminal de carvão de cerca de 30 milhões de toneladas por ano que já está em andamento. Existe ainda a reabilitação do Porto de Nacala-Porto em que fizemos estudos com apoio de alguns parceiros incluindo japoneses. Os estudos acabaram, os financiamentos já foram colocados em consideração e estamos convencidos que, em breve, vamos ter financiamento de 300 milhões de dólares para a sua reabilitação e recolocar a funcionar. Depois temos um grande desafio que é o Porto de Pemba por causa da logística do gás. Aí estamos em trabalhos preliminares, mas há uma necessidade de avançarmos muito mais rapidamente para tornar o Porto de Pemba muito mais eficiente, alargado, expandido e modernizado para suportar a indústria de gás e outros minerais que existem na província de Cabo Delgado. Portanto, de uma maneira geral, estes são projectos de carácter estruturante, mas em implementação e outros em carteira, negociação e pensamos que nos próximos anos 3/4 anos alguns deles vão tomar corpo. Os desafios e expectativas que se colocam ao nosso Governo são enormes e as nossas capacidades são limitadas. Nós somos chamados hoje a investir em pouco tempo grandes somas de dinheiro. Estimamos, por exemplo, que só nos sistemas ferro-portuários temos que investir nos próximos tempos pouco mais de 15 biliões de dólares, que é um montante muito grande, e vamos ter mais do que o triplo de capacidade dos caminhos-de-ferro que os portugueses fizeram durante todo o seu tempo de estadia como potência colonial. Os desafios e as expectativas são muito grandes e estamos a caminhar para isso.
Temos algumas dificuldades e as exigências são maiores e a nossa capacidade não tem o mesmo nível, mas o Governo está comprometido a trabalhar com o sector privado, sociedade e toda a gente para que nós possamos capitalizar as oportunidades que se oferecem hoje para que Moçambique se torne, de facto, um país a caminho de desenvolvimento e que elimine definitivamente a pobreza.
N - Este valor de investimento é para quanto tempo?
PZ - Pouco tempo! E nós já não temos tempo. No máximo vão ser entre cinco e dez anos. E temos que ter tudo isto pronto para responder as exigências de desenvolvimento do país. Se bem que quando fizemos a estratégia não conhecíamos o volume, nós pensávamos que tínhamos mais tempo para implementarmos isto, mas agora temos que implementar muito mais rapidamente. Nós, Ministério dos Transportes e Comunicações, estamos a investir mais ou menos à volta de um bilião de dólares por ano nos portos, aeroportos e sistemas ferroviários.
N - A intensa exploração do carvão mineral na bacia sedimentar do Zambeze exige a construção de um novo
aeroporto em Tete. Quais os planos neste sentido?
PZ - Em relação aos aeroportos, primeiro, dizer que nós decidimos modernizar todos os aeroportos do país. Quer a nível das aerogares, sistemas de aproximação e quer na resselagem das pistas. A necessidade de mexer com o Aeroporto de Tete não é necessariamente uma acção ditada pela existência, como se diz, de que o carvão vai exigir mais do Aeroporto de Tete. Já faz parte de uma estratégia do Governo e, obviamente, que se alia ao carvão que pode ajudar, sendo uma mais-valia. Tete está a conhecer um crescimento muito grande. Até quatro anos atrás, Tete tinha mais ou menos três voos por semana e todos de Maputo. Hoje, recebe mais de 11 por semana que não vêm só de Maputo e temos os que vêm directamente da África do Sul, para além de voos charters. Portanto, o Aeroporto de Tete está a conhecer um movimento desusado muito grande com tendência de crescer e é pensamento do Governo que o Aeroporto de Tete devia ser movimentado para outro local. É um pensamento ainda a ser estudado e já desenharam-se várias opções para onde que será o novo Aeroporto de Tete com uma pista, aerogare e terminal de carga maiores. Mas isto já
está na fase de desenhos, consultas e estamos em crer que onde está o Aeroporto de Tete hoje, num futuro próximo de cinco anos, já não poderá estar e estamos à procura de outro local para termos um aeroporto bem maior. Além disso, pensamos que Tete pode ser uma plataforma logística aérea para os países vizinhos como a Zâmbia, Malawi e mesmo a Tanzânia nos nossos voos regionais.
N - E ainda no transporte aéreo, há plano de aquisição de novas aeronaves no país?
PZ - Já estamos a implementar a aquisição das novas aeronaves e substituímos toda a frota antiga que até há dois anos dominava a LAM, que eram os Boeings 737-200, e adquirimos três Embraers 190, que estão a fazer voos cá dentro do país. Também adquirimos Bombardeais E-400 e estamos no processo de aquisição de dois Embraers 145 e, provavelmente, mais um Embraer 190. Portanto, a frota e os destinos da LAM estão a crescer. Nós abrimos a rota de Luanda, em Angola, Dar-es-Saalam, na Tanzânia e nos finais do ano passado, voamos para Harare, no Zimbabwe, onde não íamos. Aumentamos algumas frequências dentro do país como é o caso de Tete e Pemba. Praticamente comparando há 3/4 anos, a LAM tem uma frota completamente renovada e abdicamos dos 737-200, que já não estão a voar no país e temos um 737-500, que está a voar dentro do país.
N - Maputo e Matola são as únicas cidades com transporte público municipal. Para quando a sua expansão para
o resto do país?
PZ - Não, os transportes públicos urbanos não é só nas cidades de Maputo e Matola. Beira tem transportes públicos urbanos e quase todas as capitais provinciais têm algum embrião. Uns com dois, três e quatro autocarros. Em quase todas capitais provinciais iniciou o processo que ainda não é totalmente funcional, nem sequer em Maputo é totalmente funcional. Mas no que toca, pela primeira vez, os centros urbanos que nunca tiveram transportes públicos urbanos agora têm alguma coisa embora pequenina incluindo travessias.
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