1 - Alterações em matéria de denúncia e resolução do contrato
De entre as situações em que será inexigível ao senhorio a manutenção do contrato,
conta-se, entre outras, a inobservância das normas de condomínio, o uso do prédio
para fim diverso daquele a que se destinava e em caso de mora, ou de dois meses, ou
de oito dias, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, no período de doze
meses, no pagamento da renda. A resolução operara mediante comunicação,
devidamente fundamentada, ao arrendatário. O prazo para a denúncia do contrato
será, agora, de três meses. O locatário terá, de ora em diante, o prazo de um mês para
desocupar o imóvel.
O senhorio poderá denunciar o contrato com base num direito à habitação. Este
dependerá da observância dos seguintes requisitos: i) pagamento de montante
equivalente a um ano de renda; ii) ser o senhorio proprietário, ou comproprietário, do
prédio há mais de dois anos, ou, independentemente deste prazo, no caso de o ter
adquirido por sucessão; iii) não ter o senhorio há mais de um ano casa própria que
satisfaça as suas necessidades e as do seu agregado familiar de habitação própria.
Em caso de silêncio das partes, o contrato vigora por cinco anos, sendo só possível a
sua denúncia decorrido um ano da execução do mesmo.
Salvo vontade expressa das partes, não será admissível renovação de contrato com
duração inferior a 30 dias, sendo que qualquer delas se poderá opor a renovação
dentro dos parâmetros legais.
2 - Desocupação do local arrendado: a Acção Executiva para Entrega de Coisa Certa e a Acção de despejo
O espírito da versão originária do artigo 14º do NRAU continua presente na nova
redacção, pelo que a acção de despejo continua a ver o seu âmbito de aplicação
reduzido face ao antigo RAU. A admissibilidade do pedido da acção de despejo
continuará a restringir-se a duas situações: i) falta de residência permanente do
arrendatário; ii) quando este tenha outra residência ou imóvel para habitação na área
do mesmo concelho. Na pendência desta acção, que segue a forma de processo
declarativo, as rendas vencidas devem ser pagas ou depositadas. Todavia, em caso de
incumprimento por um prazo superior a dois meses (no antigo NRAU o prazo seria de
três meses) o arrendatário será notificado para no prazo de 10 dias proceder ao
depósito das rendas em causa, mais juros de mora.
Uma alteração de maior importância nesta matéria foi a reformulação do n.º 5 deste
artigo. Com efeito, doravante, o desrespeito do prazo para a regularização da entrega
das rendas vencidas não dará lugar a obtenção de um título executivo, mas sim,
permitirá ao senhorio requerer ao tribunal o despejo do inquilino com efeitos
imediatos.
Esta acção já com a antiga reforma havia cessado de ser, em termos gerais, o meio
idóneo para obter a efectiva desocupação do local arrendado, uma vez que, já nessa
altura esta matéria passou para o âmbito da acção executiva para a entrega de coisa
certa, situação que se manterá com a nova reforma. Contudo, a acção executiva para a
entrega de coisa certa conheceu, em matéria de arrendamento, alterações no que
respeita aos termos do diferimento da desocupação, no que respeita a alguns prazos.
Assim, o juiz passará a ter que decidir do pedido de desocupação por razões sociais no
prazo de 20 dias, e não em 30 dias, sendo que, a sua decisão terá apenas que ser
oficiosamente comunicada ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão
Financeira da Segurança Social no caso dos beneficiários do subsídio de desemprego
ou do rendimento social de inserção. O diferimento, agora, não poderá exceder os
cinco meses a contar da data do trânsito em julgado da decisão que o conceder. A
utilidade do prazo de diferimento é de permitir ao executado que se encontra numa
situação de grave carência económica, e que terá que desocupar a casa, um último
prazo minimamente razoável para encontrar um alojamento alternativo. Com a nova
reforma, esse prazo minimamente razoável viu-se reduzido para metade.
Relativamente à acção executiva em matéria de arrendamento chama-se a atenção
para o aditamento do art. 14º-Aº, o qual, determina que o contrato de arrendamento,
quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante
em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa
correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do
arrendatário.
3 - Processo Especial de Despejo e o Balcão Nacional de Arrendamento
Um meio processual que se destina a efectivar a cessação do arrendamento,
independentemente do fim a que este se destina, quando o arrendatário não
desocupe o locado na data prevista na lei ou na data fixada por convenção entre as
partes. Esta acção corre, num primeiro momento, no Balcão Nacional de
Arrendamento (BNA), o qual funcionara como plataforma informática junto do Balcão
Nacional de Injunções, junto de quem o senhorio ter-se-á dirigir. O balcão encarregarse-
á de notificar o inquilino, mas, caso este deduza oposição, o processo irá transitar
para as instâncias judiciais.
4 - Rendas antigas I – art. 26º do NRAU - contratos habitacionais celebrados na vigência do antigo RAU e contratos para fins não habitacionais celebrados na vigência do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro
Primeira situação transitória.
Os contratos celebrados antes da entrada em vigor do NRAU – sejam contratos com
fins habitacionais ou não habitacionais - continuaram a estar e ele submetido, mas
com algumas (novas) especificidades.
Concretamente, quando não sejam denunciados por qualquer das partes, os contratos
de duração limitada renovam-se automaticamente no fim do prazo pelo qual foram
celebrados, pelo período de dois anos (na anterior versão do NRAU seria por um
período de três anos), se outro superior não tiver sido contratualmente estipulado. Cai
a possibilidade de renovação automática do contrato por um período de cinco anos,
nos casos do arrendamento para fim não habitacional.
Os contratos de duração indeterminada, a semelhança do que se passava com a versão
originária do NRAU, continuaram por ele abrangidos, mas com alterações em matéria
das especificidades. Estas subsumem-se a três domínios específicos de denúncia, a
saber, restrições a denúncia do contrato pelo senhorio, direito de denúncia para
habitação do senhorio, e a necessidade de justificação por parte do senhorio para se
efectuar a denúncia.
Assim, quanto ao primeiro, o qual está previsto no art. 107º do RAU - senhorio que
necessite do prédio para sua habitação, ou dos seus descendentes em 1.º grau, ou
para nele construir a sua residência ou dos seus descendentes em 1.º grau – continua a
vigorar a regra que protege da intenção de denúncia o arrendatário com 65 ou mais
anos de idade ou, independentemente desta, se encontre na situação de reforma por
invalidez absoluta, ou, não beneficiando de pensão de invalidez, sofra de incapacidade
total para o trabalho, ou seja portador de deficiência a que corresponda incapacidade
superior a dois terços. Cai, todavia, a protecção ao arrendatário de 30 ou mais anos.
Verificou-se, assim, uma restrição, ainda que tímida, daquilo que se reputava como
legítimas expectativas dignas de protecção.
Relativamente ao segundo, a reformulação do art. 1102/1 do C.C. levou à criação de
um regime mais exigente do que o anterior. Assim, agora, não só terá o senhorio que
proceder ao pagamento do montante equivalente a um ano de renda, como também,
terá que, por um lado, ser titular do direito real de propriedade ou compropriedade
por um período superior a dois anos, salvo no caso de ter ingresso no referido direito
por intermédio de sucessão, e, por outro lado, não poderá ser titular de outro imóvel
em condições para ser sua residência, no mesmo concelho em causa. Desta forma, não
só se continua a exigir a atribuição de uma indemnização ao arrendatário com base
numa renda actualizada, como também, o universo de situações em que o senhorio
pode lançar mão desta faculdade de denúncia se vê mais restringido.
No terceiro caso, será necessário comunicação ao arrendatário com antecedência não
inferior a dois anos sobre a data em que pretenda a cessação. Na anterior reforma o
prazo era de três anos.
5- Rendas Antigas II - art. 28º do NRAU – contratos habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do antigo RAU e contratos não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do antigo Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro
Segunda situação transitória.
Em relação a estes contratos são aplicáveis o disposto no art. 26º para os contratos
celebrados durante a vigência do RAU e do decreto-lei n.º 257/95, de 30 de Setembro,
com algumas alterações.
Por um lado, em matéria de denúncia do contrato para fins habitacionais por parte do
senhorio, com a entrada em vigor da nova reforma, não será admissível que este
denuncie livremente o contrato, sem invocar qualquer fundamento. Por outro lado,
quanto aos contratos para fins não habitacionais, segue-se uma linha de raciocínio
totalmente diferente, uma vez que, não só se mantém a possibilidade de denúncia,
sem invocar qualquer fundamento, como ainda o prazo para a invocar poderá ser não
aquele que consta na nova redacção do art. 1101/c do C.C., mas na versão anterior, ou
seja, cinco anos, e não dois, desde que nos deparemos com uma das seguintes
situações: i) que ocorra trespasse, locação do estabelecimento ou cessão do
arrendamento para o exercício de profissão liberal; ii) sendo o arrendatário uma
sociedade, ocorra transmissão inter vivos de posição ou posições sociais que
determine a alteração da titularidade em mais de 50 %. O prazo de cinco anos para
denúncia será aplicável apenas quando as situações anteriormente referidas ocorram
aquando da entrada em vigor da nova reforma.
Se o arrendatário tiver idade igual ou superior a 65 anos ou deficiência com grau
comprovado de incapacidade superior a 60 %, a invocação do disposto na alínea b) do
artigo 1101.º do Código Civil - para demolição ou realização de obra de remodelação
ou restauro profundos que obriguem à desocupação do locado - obriga o senhorio, na
falta de acordo entre as partes, a garantir o realojamento do arrendatário em
condições análogas às que este já detinha, quer quanto ao local quer quanto ao valor
da renda e encargos.
Em matéria de actualização das rendas, e ao contrário do que se verificava
anteriormente, aplica-se o mesmo método que para os restantes contratos.
Ainda assim, no seguimento do que se verificou com a anterior reforma, foi intenção
do legislador manter a opção por um progressivo alargamento do âmbito de aplicação
do novo regime substantivo aprovado com a nova reforma, se bem que agora de
forma mais restrita, para, que assim, fossem salvaguardadas as legítimas expectativas
e a igualdade das partes, respeitando o momento histórico em que o contrato foi
celebrado.
6- Actualização das rendas: considerações gerais sobre os artigos 30º e seguintes do NRAU; de um modelo fixo, matemático e regulado para um modelo (pouco) flexibilizado
Verificou-se uma mudança de paradigma. Foram abolidos os coeficientes anuais, os
quais foram substituídos por um procedimento negocial entre as partes contratantes.
A iniciativa para despoletar este procedimento cabe sempre ao senhorio, ao qual,
assim querendo, compete apresentar uma proposta de actualização ao arrendatário.
Este, por sua vez, ou aceita-a, ou apresenta uma contraproposta, ou, então, denuncia
o contrato. Ambas as partes gozam de um prazo de 30 dias para responderem à
resposta da contraparte, sendo que, o silêncio tem valor de aceitação. Se as partes
chegarem a acordo, a renda é actualizada e o contrato passa para cinco anos, salvo se
houverem acordado um prazo distinto. Na ausência de acordo, de duas uma, ou o
senhorio denuncia o contrato e paga uma indemnização equivalente a cinco anos de
renda calculada pelo valor médio da soma das propostas apresentadas pelas partes,
havendo um agravamento do montante indemnizatório no caso de o acordo falhar por
pouco, ou, no caso de o senhorio não deter dinheiro suficiente para pagar a
importância que emerge das duas propostas, a titulo indemnizatório, poderá actualizar
a renda até ao limite máximo de 1/15 do valor patrimonial.
No caso de o arrendatário optar por denunciar o contrato, a denúncia produzirá
efeitos no prazo de dois meses, a contar da recepção pelo senhorio da decisão do
arrendatário. Este deverá, então, desocupar o imóvel, e entregá-lo ao senhorio no
prazo de 30 dias. Consequentemente, da comunicação da denúncia até ao momento
em que o imóvel terá que estar impreterivelmente vago, correrá um período de três
meses.
Especificidade: no caso de o arrendatário invocar e comprovar que tem idade igual ou
superior a 65 anos ou deficiência com grau comprovado de incapacidade superior a
60 %, o contrato só fica submetido ao NRAU mediante acordo entre as partes. Será,
portanto, possível que, nomeadamente, por falta de aceitação do arrendatário, o
contrato continue a ser disciplinado pela legislação anterior. Todavia, mesmo em caso
de acordo das partes, o procedimento negocial para efectuar a actualização das rendas,
apresenta como particularidade o facto de que, se o senhorio não aceitar o valor da
renda proposto pelo arrendatário, o contrato mantém -se em vigor sem alteração do
regime que lhe é aplicável, sendo que, aplicar-se-á um período de carência de cinco
anos, durante o qual, o valor de renda passível de aumento terá como limite máximo,
em regra, 1/15 do valor do locado, salvo se se verificar algum circunstancialismo
atenuante que possibilite um aumento ainda menor. Só decorrido o período de
carência de cinco anos, e observados certos requisitos em matéria de rendimentos do
arrendatário, é que o senhorio poderá promover a transição do contrato para o NRAU,
e, consequentemente, proceder a uma actualização das rendas de acordo com o
procedimento negocial geral. Encontram-se em situação análoga as seguintes
entidades: locado onde, ou opere um estabelecimento comercial aberto ao público
que é uma microentidade, ou associação privada sem fins lucrativos, ou casa fruída por
república de estudantes.
7- A realização de obras profundas no imóvel como justificação para despejo
A realização de obras passa a constituir motivo para despejar os inquilinos, mediante o
pagamento de indemnização correspondente ao valor de um ano de rendas. Ao
senhorio bastará comunicar por escrito ao inquilino a sua intenção, com seis meses de
antecedência, apresentando juntamente o parecer favorável do município para a
realização das obras. O técnico do projecto será obrigado a um termo de
responsabilidade e o senhorio terá que dar início às obras no prazo de seis meses. Não
observado esse prazo, terá que pagar ao arrendatário, a título de indemnização, o
valor correspondente a dez anos de renda. O senhorio será ainda obrigado a realojar o
inquilino, a expensas próprias, numa freguesia limítrofe, no caso de este ser idoso,
deficiente ou necessitado, e isto tendo sempre presente, o seu agregado familiar.
8- Outras alterações, a serem introduzidas em diploma próprio
O decreto-lei faz alusão, ainda, a situações que serão posteriormente objecto de
inovações, autonomamente, num futuro próximo, que ficaremos a aguardar com
alguma expectativa. São estes:
O contrato de seguro de renda: prevê-se a adopção de diploma próprio no prazo de
120 dias. Objecto principal a cobertura do risco de incumprimento pelo arrendatário
da obrigação do pagamento de um certo número de rendas ao proprietário;
A tributação de rendas de prédios urbanos auferidas por pessoas singulares: não está
previsto data para aprovação do diploma, mas o decreto-lei faz alusão à possibilidade
da aplicação de uma taxa especial de tributação em sede de IRS, como forma de assim
se uniformizar a tributação destes rendimentos com a tributação dos rendimentos de
capitais. Portanto, parece abrir-se caminho à criação de uma taxa liberatória que
incidirá sobre as rendas das pessoas singulares;
Das alterações acima mencionadas, parece resultar uma opção por uma liberalização
e desregulação paulatinamente lenta, de forma a amortecer as consequências sociais
secundárias que, incontornavelmente, se terão que verificar com a transição deste
segmento de negócio para o Mercado.
Actualmente, de 5,9 milhões de casas, só 772 mil se encontram arrendadas de
acordo com os padrões legais. Destas, 255 mil tem rendas anteriores a 1990. Uma
dinamização é, portanto, urgente.
Não obstante, esta irá depender, essencialmente, de dois elementos: da celeridade
da actualização das rendas e da efectiva criação de uma taxa liberatória para
incentivar o investimento.
De momento, dado o estado ainda embrionário destas alterações, parece-nos que,
dados os parâmetros particularmente apertados da actualização de rendas, e os
montantes pecuniários necessários mobilizar, que estas alterações podem ser
particularmente interessantes, numa primeira fase, para fundos de investimento
imobiliário.
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